Sinopse: O corpo nos pertence ou pertencemos a ele? Essa carne, desmontada e remontada, rasga na estreia de Maria Eduarda Lima dividida como forma e símbolo. Drummond nos diz que: “a verdade essencial/é o desconhecido que me habita/e a cada amanhecer me dá um soco”. Já “Cutícula”, nos fala sobre o conhecido que nos habita e que mesmo assim nos atinge. As ruas da cidade que conhecemos, os amores que sonhamos, ainda mais aqueles que vivemos “trocando em miúdos/ofensas e discos”. Amores que se traduzem em saudade, em terra, em sofrimento e em amor, também. Esse livro-corpo nos põe um laço, enlata o afeto e nos faz sentir o sal do lençol na boca. Comungamos esse livro. Esse corpo. Ou simplesmente o dividimos como “felinos felizes/teimosos de menos”. [texto de orelha, de Pedro Torreão]
Leia um poema:
A morte de severino lindo
severino lindo
era porteiro de higienópolis
e todo porteiro de higienópolis
é nordestino
mas era diferente dos outros
não ouvia rádio
não falava de futebol
não fofocava
não atrasava para abrir a porta
não colocava o dedo no cu do poodle da loira do 84
severino lindo
sempre de cabeça baixa
sim, senhora
não, senhora
boa tarde
como vai
um dia enquanto desentupia minha privada
ouvi cantarolar
lembro de ter pensado
severino lindo canta
mas quando cheguei perto
voltou a se calar
não tinha voz
dele não sei nada
era do piauí ou maranhão
preto, marrom, amarelo
casado ou viúvo
tanto faz
era porteiro
severino lindo
foi encontrado morto
na rua maceió
com a calça baixa
e um saco de pão
no elevador um aviso
tem caixinha na portaria
para mandar uma coroa de flores
a severino lindo
deixei cinco reais
severino lindo morreu
e eu já esqueci seu rosto
que nunca vi
para poder lembrar
Cutícula
Maria Eduarda Lima cresceu na praia do Janga, em Pernambuco. Morou em Recife e hoje reside em São Paulo, onde trabalha, estuda, escreve e espia a vida dos outros. Formada em Jornalismo pela Universidade Católica de Pernambuco, trabalhou durante mais de 10 anos na área da comunicação. Apesar de a escrita ter atravessado toda a sua trajetória, foi em São Paulo que passou a se dedicar ao estudo da literatura e dramaturgia. Membro do Departamento Formação em Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, atualmente atende adultos e adolescentes. Acredita piamente que as palavras curam e que a escrita é uma catarse de afetos. Cutícula é o seu primeiro livro de poemas e emerge de textos escritos em diferentes momentos da sua trajetória.
Ficha técnica da obra:
Livro de poesias, com sobre-capa em
Dimensão: 14x21 cm
94 páginas.* imagem ilustrativa