Sinopse: Em uma cidade litorânea do Vale do Itajaí seres místicos e folclóricos convivem perdidos na sociedade e se emparelham com os problemas atuais abrindo sua atuação não apenas em proteger as florestas, mas agora a todos aqueles na cidade que precisam de ajuda. Com a força da poderosa lua cheia é quando os mistérios se revelam, e não poderia ser por menos que todas as histórias contadas são abençoadas por essa luz, onde as crianças não são sequestradas pelo homem do saco, mas sim acolhidas por essa entidade; mais bruxas foram assassinadas no Brasil colônia do que falas as narrativas oficiais. Em Contos Fantásticas do Vale novas histórias são reveladas e mitos revistos.
 
Leia um trecho do conto O filho das águas:
 
O céu estava encoberto de nuvens escuras. Anunciava-se uma grande tempestade. A claridade se esvaía dando lugar à escuridão pré chuva, o cheiro da terra eriçada de umidade previa a tromba d´água que cairia dali a pouco.
 
Era um fatalista de nascença, Edimundo. Sabia, enquanto fugia para a segurança de casa, que o seu mundo estava acabando. Sabia também que essa tempestade era sua, sua cria, todo o seu ser, sentia o peso da orfandade, do seu corpo, do desejo contido, da morte, a soma represada aguardava o momento que a resistência rachasse e cedesse à pressão.
 
E esse era o momento.
 
                                                                       Ξ
 
Na cidade onde cresceu, nenhum segredo tinha duração longa, era um filete de pólvora que se consumia rápido. Nada fugia das irmãs Gugeu que mantinham o ritual de uma vida, eram as fontes das notícias. Moravam em uma casa de esquina na avenida que tem o nome da cidade, portanto, o caminho mais rápido de chegar e levar as fofocas. O chifre que o seu Roberson levou ficou de conhecimento de todos em menos de uma hora do ocorrido! Mas, sendo justo, a notícia das pragas nas plantações dos Silva e dos Oliveiras ajudou a proteger os cultivos dos outros. Elas sabiam de qualquer segredo, mesmo aqueles seguros à sete chaves.
 
Menos um, Edimundo se gabava intimamente, sabia que pelo menos o seu as irmãs não sabiam, e ao mesmo tempo morria de medo de que fosse descoberto. Perderia tudo.
 
Para comemorar o aniversário de quinze anos seu primo o convidou para acamparem na mata do Corvo. A trilha era longa, iriam cedo pra chegar ao meio-dia. Montaram a barraca e comeram os salgadinhos que levaram. A ideia era esperar para ver o amanhecer. Comemoraram com a cachaça que o primo comprou de presente. Edimundo, como não estava acostumado com álcool, capotou em um sono pesado antes mesmo da garrafa chegar na metade.
 
A lua cheia brilhava na copa das árvores, tudo era pincelado com um tom prateado, o barulho dos insetos, em noite de verão, era alto e as corujas, empoleiradas, observavam a barraca dos primos. Nenhuma nuvem naquele céu preto-azulado, parecia um lugar cheio de magias e mistérios.
 
Dentro da tenda Edimundo acordou no susto, sentiu seu corpo aprisionado por algo que o dominava fortemente. O bafo do seu primo, sobre sua orelha, era quente e fedia a cachaça. Tentou se libertar, freneticamente tentava soltar seu corpo, mas mal conseguia desprender um dos braços, já era recapturado com outra torção. O corpo todo rígido e a cabeça latejando foram acrescidas da dor quando em quatro investidas secas e brutas o primo terminou e tombou exausto para o lado, caindo no sono em seguida.